domingo, 21 de fevereiro de 2010

Guerras Civis - embates de Ideologias


Guerras Civis

(aspectos ideológicos)

Guerra civil foi especialmente radical em países onde a Esquerda (ou melhor: os favoráveis a Democracia Social), era mais forte, com seus movimentos sociais, sejam com esforços de socialistas, comunistas, anarquistas, social-democratas, etc.

Encontramos o exemplo da Alemanha logo após a Primeira Grande Guerra (1914-1918) com a criação de conselhos de soldados e operários, nos moldes dos Soviets russos, que organizaram o 'caos' durante a queda da Monarquia germânica, enquanto parte do Exército apoiava os Guardas Brancos na Finlândia (1918) contra a Guarda Vermelha (apoiada pelo Exército Vermelho russo). Assim, a Guerra Civil finlandesa mostrou-se uma cisão entre russófilos e germanófilos, além de revolucionários e reacionários. Foi um conflito mais brutal na região sul e sudeste da Finlândia – região de forte industrialização e grande população – com destaque para a Batalha de Tampere (1918)

A mesma polarização – revolucionários e reacionários – mas então comunidtas X fascistas – ocorreu na Guerra Civil espanhola (1936-1939) com os reacionários, monarquistas, falangistas recebendo o apoio de infantaria italiana e aviação alemã (ambos de governos fascistas-centralistas-imperialistas) , enquanto os legalistas, os republicanos, os liberais, os socialistas, os anarquistas combatiam com as próprias forças, e os comunistas recebiam apoio soviético (nem vamos comentar as políticas bizonhas de Stálin), e as potências ocidentais ditas liberais e democráticas nada fizeram para interferir – exceto que muitos cidadãos volutnariamente se inscreveram nas Brigadas Internacionais e foram combater em prol da Democracia liberal (ou da Democracia Social) na Espanha.

Também a Itália quase sofreu uma 'guerra civil' na década de 20, com os embates entre socialistas, comunistas (estalinistas e trotskistas), anarquistas contra os fascistas – muitos saídos das fileiras do sindicalismo e do socialismo (como é caso do próprio Mussolini). Traidores dos movimentos proletários não faltaram nesse triste década de 20 – na Europa – que foi encerrada ainda mais tragicamente com a Quebra da Bolsa de Nova York, em 1929.

Depois da Primeira Grande Guerra – que colocou proletários contra proletários – os movimentos sociais perceberam que não poderiam competir com os sistemas de produção capitalista. Perceberam que expansão e internacionalismo da luta anti-capitalista era essencial para o fortalecimento do socialismo, que não poderia ser um 'sistema' de competição com o capitalismo, mas precisaria substituir a 'competição' pela ' cooperação' – daí a proliferação de cooperativas, empresas com auto-gestão dos próprios operários, sistemas de apoio mútuo, uma previdência não estatal, mas descentralização entre os grupos de proletários, etc.

Contudo, com as expansão dos movimentos sociais, os burgueses e monarquistas reacionários logo reagiram, também 'polarizaram', e o foi o que bastou para AMBOS OS LADOS radicalizarem. Tanto direita quanto esquerda realizaram barbaridades vergonhosas. Mas os mais 'brutais' – os reacionários – venceram.

Os socialistas (termo amplo que pode incluir tanto anarquistas quanto comunistas)(*) não venceram porque não foram tão brutais quanto os reacionários – sejam monarquistas, burgueses, fascistas, etc – sendo estes centralziados e hierarquizados, enquanto aqueles, os socialistas, eram descentralizados e sem liderança. (Aliás, falar em 'líder' anarquista, p.ex., não faz sentido...)

Os monarquistas finlandeses - Guardas Brancos - receberam apoio dos monarquistas alemães, enquanto os falangistas espanhóis receberam apoio dos fascistas italianos e alemães – que haviam sufocado as revoluções em seus próprios países (Mussolini marchou para Roma em 1922, e a revolução alemã foi sufocada em 1923 ).

A Alemanha não tivera 'revolução burguesa' (não ao estilo da francesa, de 1789 a 1799), mas uma 'unificação' (1870/71) por vias militares, sob hegemonia prussiana, numa união de nobres e burgueses contra proletários, em processo arquitetado de 'cima-para-baixo' (bem ao estilo antiparlamentarista de Bismarck), e a mesma Alemanha sufocou a possível 'revolução proletária' – na forma de vários comitês de operários, como é o exemplo da República Soviética da Bavária - que poderia internacionalizar o socialismo e evitar o nacionalismo russo na forma de “estalinismo” (nada mais que 'golpe napoleônico' dentro do próprio Bolchevismo, com a revolução 'devorando seus filhos', e dando lugar para os burocratas partidários da Nomenklatura...)

Assim, a vitória da República de Weimar – com discurso social-democrata, mas favorável aos monarquistas – sobre os movimentos socialistas e comunistas nada mais nada menos que 'pavimentou' o caminho para o Nazismo (dito: Nacional-Socialismo, onde a incoerência começa no nome), quando a Direita – após mastigar a Esquerda - engoliu o Centro.

Na Itália, o ex-socialista Benito Mussolini marchou sobre Roma com um conjunto de militares, populistas, corporativistas, ex-sindicalistas, etc, e obigou a Monarquia a aceitar uma diarquia (poder duplo) Rei – Duce. Governo que se radicalizou eliminando a oposição de Esquerda e de Centro, e colocou os italianos numa guerra total contra os franceses, os anglo-americanos e os russos.

Então por que os russos vermelhos venceram na Rússia? Primeiro, a Primeira Grande Guerra desestabilizou o Tzarismo (Czarismo). Segundo, a experiência dos Sovietes era mais consolidada, a ponto de ser um poder paralelo ao Governo Provisório de Kerenski, claramente burguês e liberal. Terceiro, quando Lênin resolveu levar a revolução adiante – radicalizando em outubro de 1917 – ele foi obrigado a estabilizar o governo novo (do Partido Comunista) como um 'centralismo' – um eufemismo para Ditadura – e decretar de 'cima-para-baixo' – Lênin incorporou uma prática de Bismarck – e apenas afastou os social-democratas, os socialistas-revolucionários e os anarquistas – criando uma 'ditadura do Partido', a vanguarda, que dizia implantar uma 'ditadura do proletariado' (segundo os conceitos de Marx)

E os Bolcheviques venceram os Guardas Brancos porque foram mais 'centralistas' – e por que não dizer tudo? - mais 'brutais' que os 'Brancos'. Olho por olho, dente por dente. Obviamente, disso não poderia sair um Socialismo.

Na Rússia criou uma ditadura unipartidária, centralista e estatista, que mais prejudicou o movimento operário (e os movimentos sociais em geral) do que realmente ajudou. A prepotência de Lênin criou uma divisão entre leninistas e outros socialistas (p.ex. os que seguiam Rosa de Luxemburgo), e a ascensão de Stálin – contra os demais figurões do Partido – criou uma cisão “Estalinistas” versus “Trotskistas”. Nessa divisão, os 'comunistas' se prejudicaram, como é visivel o exemplo trágico da Guerra Civil espanhola.

jan/fev/10

Leonardo de Magalhaens

nota:

(*)o termo 'socialista' é visivelmente ideológico, refere-se aos apoiadores da Democracia Social de forma ampla. Pois encontramos comunistas que se dizem 'socialistas', mas nem todo socialista é comunista; assim como existem os anarquistas que se dizem 'socialistas', mas nem todo socialista é anarquista. E socialista não significa exatamente 'anti-capitalista' (outro termo amplo e genérico) pois um fundamentalista islâmico pode ser 'anti-capitalista' e ser nada 'socialista'. Nem significa que o 'socialismo' seja 'ateísmo', pois muitos se dizem 'socialitas cristãos', ao proclarem Cristo como um libertário, combatendo pelo social, em contraponto a imagem hierárquica dos líderes religiosos (principalemente, o catolicismo com o centralismo da Santa Sé/Vaticano)

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Drôle de Guerre - 'os homens não merecem a paz'






dezembro/ 1939



segunda-feira, 18



"Os homens, dizemos – afirmava Maheu em sua última carta -, não merecem a paz. É verdade. Verdade no sentido simples de que eles fazem a guerra. Nenhum dos homens atualmente mobilizados (sem exceção de mim, naturalmente) merece a paz, porque se a merecesse realmente não estaria aqui. - Mas pode ter sido obrigado, forçado... Tá tá tá: ele era livre. Compreendo que ele partiu acreditando que não tinha outro remédio. Mas essa crença era decisória. E por que ele decidiu assim? Aí reencontramos os móveis e a cumplicidade. Por inércia, fraqueza, respeito pelo poder, medo de uma condenação – porque calculou as possibilidades e concluiu que arriscava menos obedecendo do que resistindo – por gosto pela catástrofe – porque sua vida não o prendia bastante (nesse sentido, melhorar sua vida, tanto quanto o permite a natureza do objeto, significa trabalhar pela paz. Conheci alguns que, por terem tido insucesso no casamento, declaravam, em outubro de 1938, que encaravam a guerra com indiferença, sem parecer compreender que sua situação de homens históricos dava peso e consequência a essa indiferença e que ela facilitava o início da guerra – não por fazê-la eclodir, mas por serem cúmplices ) - porque precisava de um grande cataclismo para cumprir sua profissão de homem – por importância, idiotice, ingenuidade, conformismo – por pavor de pensar livremente – porque era um galo de briga. Por isso, na guerra não há vítimas inocentes. Se as houvesse, aliás, elas recomeçariam a guerra por sua própria conta usando mil modos para se tornarem cúmplices no detalhe da sua vida militar. De modo que o mito da redenção adquire aqui toda a sua força moral: a natureza da historicidade é tal, que só cessamos de ser cúmplices tornando-se mártires. Só não merecem a guerra os homens que aceitam o martírio pela paz. Só eles são inocentes, pois a força de sua recusa é bastante grande para suportarem o infortúnio e a morte. Assim, é verdade que, aceitando as consequências da sua recusa, eles sofrem inocentes pelos outros. Não existe, pois, outro modo de assumir nossa historicidade senão tornando-se mártires e redentores. (...)"


Jean-Paul Sartre




trad. Aulyde Soares Rodrigues / 1983

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Drôle de Guerre - a paz-guerra






Drôle de Guerra

trechos do Diário de Jean-Paul Sartre

trad. Aulyde Soares Rodrigues / 1983


terça-feira, 5 dezembro /1939

“... eu anoto as passagens principais de um artigo
de X. publicado na Revue des Deux Mondes de
15 de agosto de 1939: “A Paz-Guerra”.

... “O conceito clássico da guerra conduz, portanto, a
uma forma de conflito que não corresponde às
possibilidades e às necessidades da Europa, atualmente.
A Europa, na verdade, não se refez ainda dos inconvenientes
de todo tipo provocados pela Grande Guerra. Precisa de
paz para se refazer e reorganizar sua economia em
função dos meios modernos de produção... Por outro lado,
a opinião pública, na maior parte das nações europeias,
recusa-se instintivamente a aceitar a ideia da guerra...
Essa convicção é um fato capital peculiar da nossa época.”

...

“Assim, essa repugnância pela guerra total, por uma
transformação surpreendente, autoriza o emprego da
violência que ultrapassa nitidamente as regras da tradição
diplomática... Já não é a paz e ainda não é a guerra que
conhecíamos, mas um estado intermediário que chamaremos
de paz-guerra.

“A paz-guerra repousa na ideia de aproveitar o temor da
guerra-catástrofe para exercer pressões mais enérgicas
do que antigamente, evitando criar uma tensão suficiente
para levar o inimigo à guerra total.

“O primeiro elemento de toda combinação consistirá,
portanto, em avaliar o ponto crítico além do qual o
adversário preferirá a guerra total à capitulação.

“Procedimento característico: guerra política, isto é,
intervenção na política interna do país adversário. Atacam-se
assim diretamente os centros nervosos dos quais depende
a capitulação. (Ludendorff, guerra total: a coesão anímica
da nação é fator essencial da vitória.)” (...)

...

Lendo agora o diário de Sartre, é possível perceber o quanto
o artigo citado está correto.

Pois os Nazistas adotaram justamente estas diretrizes de
'ataque interno' com as 'quintas colunas' alojadas dentro
dos Estados-Nações que eram alvo de ações militares.
Vide o traidor Vidkun Quisling na Noruega, vide a ação
dos franceses reacionários, fascistas, que pregavam o fim da
democracia, ou então os grupos de fascistas de Oswald Mosley
na Grã-Bretanha, que eram favoráveis às negociações com o
Führer Hitler e o temível III Reich.



Leonardo de Magalhaens

http://leonardomagalhaens.zip.net/


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