Diário de Berlim
William Shirer
trad. Alfredo C. Machado
1940
BERLIM, 11de abril
Londres anuncia que Bergen e Trondheim foram recapturadas pelos Aliados. O Alto Comando desmente categoricamente a informação. Como desmente também as notícias veiculadas de Londres sobre uma grande batalha naval no Skagerrak – teatro da batalha da Jutlândia, na Grande Guerra. As únicas perdas navais confessadas até o momento são a do cruzador Blücher, de 10.000 toneladas, ocorrida no fiorde de Oslo, e do cruzador ligeiro Karlsruhe, de 6.000 toneladas, ao largo de Kristiansand, ambos afundados pelas baterias norueguesas na manhã de 9 do corrente.
Soube que Hitler advertiu a Suécia das terríveis consequências que lhe traria uma atitude inamistosa, assumida nas atuais circunstâncias. Tanto quanto sei, os suecos estão extremamente amedrontados, nada farão para auxiliar os seus irmãos noruegueses e, mais tarde, receberão também a parte que lhes toca. É estranho como essas pequenas nações preferem ser tragadas pelo Führer, uma de cada vez.
Um porta-voz do Ministério do Exterior declarou-nos ainda hoje que o Presidente do Parlamento Norueguês, Hambro, nada mais era que “um sujeito sujo e judeu”. Agora, vê-se que o homem com quem os nazistas contavam na Noruega é um antigo Ministro da Guerra, de nome Vidkun Quisling, que, segundo parece, dispunha de uma forte e eficiente “quinta-coluna”. Um dos funcionários da Wilhelmstrasse revelou-me que Quisling seria o Primeiro-Ministro da Noruega. O Boersen Zeitung queixa-se da “incompreensível atitude do Rei Haakon... Pela sua atitude inflexível, o monarca mostrou estar muito mal aconselhado e não ser o verdadeiro defensor dos interesses de seu povo.”
Hoje à noite a BBC diz que Churchill declarou perante a Câmara dos Comuns que “Hitler cometeu um grande erro estratégico” e que a esquadra britânica vai agora tomar conta do litoral norueguês e afundar todos os navios que encontrar no Skagerrac (sic) e no Kattegat. Espero que esteja certo.
(nota minha:)
Skagerrak e Kattegat são os mares estreitos entre a península da Jutlândia (onde está a Dinamarca) e a Escandinávia (Noruega e Suécia), e fazem a conexão entre o Mar do Norte e o Mar Báltico (ou Ostsee, em alemão)
BERLIM, 14 de abril
Até que enfim descobri como os alemães, sem possuírem uma esquadra adequada, ocupraram os principis portos noruegueses, situados ao longo de um litoral de mais de mil e seiscentos quilômetros de extensão, mesmo às barbas da Home Fleet. As tropas alemãs, juntamente com seus canhões e respectiva munição, foram transportadas a seu destino em cargueiros que ostensivamente se achavam a caminho de Narvik a fim de transportar o minério de ferro sueco.
Esses cargueiros, como aliás vinham fazendo desde o início da guerra, navegavam dentro dos limites dos cinco quilômetros das águas territoriais norueguesas, escapando assim de serem descobertos pelas belonaves inglesas! E quanta ironia! - foram mesmo escoltados até os objetivos visados pelos próprios navios de guerra noruegueses, que tinham instruções de protegê-los contra os ingleses!
Isso, entretanto, não explica por que motivo os ingleses deixaram uma grande parte da esquadra alemã – 7 destroyers, 1 cruzador pesado e 1 couraçado – subir toda a costa norueguesa sem ser pressentida.
Os círculos navais alemães admitem que os seus 7 destroyers foram destruídos por uma força naval britânica numericamente superior durante o combate travado ontem em águas de Narvik, afirmando que, entretanto, continuam de posse da cidade. Todavia, os jornais de amanhã dirão: REPELIDO ATQUE INGLÊS CONTRA NARVIK. Quando mostrei, hoje à noite, uma das edições dos matutinos que vão aparecer amanhã a um capitão da Marinha, ele não pôde deixar de sentir-se envergonhado, praguejando contra Goebbels.
Soube que o General von Falkenhorst fez publicar a seguinte proclamação em Oslo: “O governo norueguês rejeitou várias propostas de cooperação. Assim, é o povo norueguês que deve decidir agora sobre o destino de sua pátria. Se esta proclamação for obedecida, tal comoa conteceu na Dinamarca, a Noruega será poupada aos (sic) [dos] horrores da guerra. Entretanto, desde que seja oferecida qualquer nova resistência e rejeitada a mão estendida com inteções tão amistosas, então o Alto Comando Alemão ver-se-á obrigado a agir com meios mais violentos para quebrar inteiramente essa resistência.”
Hitler está plantando na Europa uma semente que, um dia, destruirá não apenas ele próprio como também a sua nação.
(nota minha:)
General von Falkenhorst foi o Comandante alemão responsável pela Operation Weser-Exercise, ou Unternehmen Weserübung [Exercício Weser], o codinome da Invasão da Dinamarca e da Noruega em abril de 1940. Segundo consta, o General não planejou a Invasão através de mapas militares, mas usando um guia de turismo Baedeker. O que mostra uma grande dose – para dizer o mínimo – de improvisação e imaginação. A aventura nazista ainda levaria à improvisações mais desastrosas.
Leonardo de Magalhaens
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